Faço 21 k na rua, já posso fazer 21 k trail?
Poder até pode, claro. Mas não é o ideal.
Para quem tá começando agora no trail run, a primeira coisa a saber é que o o corpo precisa de um tempo de adaptação ao novo tipo de estímulo. E isso não é do dia pra noite. Uma vez que o novo ambiente são normalmente terrenos irregulares e com variação de altitude.
Quando corremos na rua normalmente não nos preocupamos "onde" vamos pisar, pois, sabemos que todo o piso é plano, e nossos pés sempre vão tocar o solo da mesma forma, fazemos isso de forma inconsciente.
Mas no trail run isso não acontece devido essa irregularidade do terreno, normalmente com muitas pedras de diversos tamanhos, buracos, galhos etc. Assim, os pés precisam estar acostumados a tocar o solo de maneiras diferentes. Vamos dizer que devem ser mais flexíveis ou maleáveis, absorvendo parte dessa irregularidade e evitando principalmente as torções.
E como fazer para deixar os pés assim? Correndo e praticando. Experimentando novos ambientes. Mas os exercícios específicos de mobilidade e fortalecimento também auxiliam muito nesse processo.
Outro detalhe que o trail runner também sempre está atento, diferente do corredor de rua, é sobre a famosa "altimetria" do percurso, ou seja, à diferença de altitude durante o percurso, o sobe e desce, conhecido também como ganho de elevação, ganho acumulado ou desnível acumulado. Com essa informação o atleta tem noção do nível de dificuldade do percurso, podendo se preparar e montar sua estratégia. Tem um artigo aqui no Blog explicando isso com mais detalhes, "Gráficos de Altimetria".
Podemos dizer que, além do esforço físico de “correr para frente”, o atleta deverá se adaptar a correr subindo e correr descendo. O que exigirá muita força nas subidas, e muita estabilidade das articulações nas descidas. E para isso, o corpo também precisará se adaptar. (isso pode ser tema para outro artigo de um profissional da área)
Isso também acontece com o tempo de corrida e prática, e mais uma vez, com o auxílio de exercícios específicos de fortalecimento e estabilização.
Basicamente sobre a parte "física" do trail run é isso. Supondo que você já é corredor “de rua” com certa experiência, sabe que as preocupações dos corredores normalmente são muito o ritmo/pace e velocidade.
Mas no trail não se fala muito em ritmo e velocidade. Pois como os percursos apresentam muita variação de elevação, esse sobe e desce, não é possível manter um ritmo constante, nem forte na maioria das vezes, assim, é impossível comparar marcas pessoais, uma vez que os 10 k onde eu corro é diferente dos 10 k onde você corre. A não ser que a comparação seja feita com relação a um mesmo percurso.
Mas é claro que todo corredor sabe suas marcas pessoais de rua, afinal todos treinam na rua também, e todos querem melhorar seus tempos.
O trail runner vai estar mais preocupado com os obstáculos que vai encontrar no percurso, como, buracos, pedras, galhos, troncos, espinhos, lama, travessias de águas etc. Coisas que podem causar uma torção, um corte, atingir os olhos, fazer você cair e se ferir, até gravemente.
Falando assim pode parecer exaustivo para quem não pratica. Mas não é. Pelo contrário, o atleta acaba não percebendo a distância percorrida por "se distrair" atento a esses detalhes. Muitas vezes correr 5 km na rua pode ser até tedioso para alguns, mas talvez correr uns 10 km na trilha pode passar sem se perceber.
Normalmente o trail runner é o atleta que busca na corrida uma forma de qualidade e estilo de vida. Busca a integração da atividade física com a natureza. A atividade apenas pra relaxar e se divertir sem se preocupar muito com performance.
E com relação à tênis, equipamentos, suplementação etc, o que preciso pra começar?
Pra ser sincero, inicialmente não precisa de nada se você já corre na rua. Com certeza um dos seus tênis de corrida de rua vai ser mais que suficiente pra esse início.
Os equipamentos mais comuns são os tênis e as mochilas de hidratação. Mas pra facilitar e ficar bem detalhado, sobre mochilas tem um artigo completo aqui no Blog, "Mochila de hidratação - Qual é o melhor modelo?", e pra conferir é só clicar aqui.
Sobre os falados "tênis de trilha", existem vários modelos e opções disponíveis no mercado. Mas normalmente a maioria dos corredores acabam comprando modelo errado para seus primeiros tênis. Mas como assim?
É que a maioria dos corredores iniciantes acham que pra correr em trilha os tênis têm que ter aquelas travas enormes no solado. E esse é um grande erro de iniciante.
Na verdade os tênis PODEM SIM ter essas travas altas, mas são ideais para condições específicas de terreno. O modelo mais comum desse tipo que muitos compram é o SpeedCross da Salomon. Um verdadeiro tanque que guerra.
Sem dúvida é um tênis bom, mas não é o ideal pra quem está começando, principalmente pra quem tem mais sobrepeso. Por ter travas altas ele possui pouco amortecimento, deixando o tênis mais duro, mais seco e menos confortável, tornando o processo de adaptação ao trail mais sofrido, principalmente para as articulações.
Essas travas muito altas (uns 5 mm ou mais de altura) são recomendadas para terrenos encharcados ou muito técnicos, onde se precisa de muita tração, o que não encontramos na maioria das condições em território nacional.
Essa característica de solado com travas é chamado de grip, e existem vários tamanhos (altura) e formas. A escolha será em função do tipo de terreno que vai praticar. É comum e recomendado, se possível, possuir mais de um tênis com diferentes grips, podendo escolher o melhor para cada condição. Caso contrário, um modelo mais versátil é o ideal para atender na grande maioria das situações.
Os modelos com grip mediano/baixo (em torno de 3 a 5 mm de altura) são mais recomendados pra quem está começando, pois vão atender na maioria das situações, e normalmente são mais confortáveis, ideal processo de adaptação.
Existem também os chamados "tênis híbridos", praticamente igual à um tênis de corrida de rua, com travas bem baixas, para condições mistas com corrida de rua e trilha numa mesma atividade.
Hoje em dia no mercado, são inúmeras marcas e modelos, com grips de todos os tamanhos, níveis de amortecimento, cores e preços. Os de grip mais altos normalmente são mais secos/duros, menos maleáveis. Já os de grip médio e baixo, é possível encontrar modelos mais ou menos macios, e com perfil de entressola mais alto ou baixo.
Depois que já praticou por um tempo o trail run, o atleta já é capaz de identificar o tipo de tênis de sua preferência, o que se adapta mais ou o modelo para algum treino ou prova específica, e aí sim adquirir seu tênis ideal.
Sobre suplementação e alimentação, também é muito relativo de atleta para atleta. Muitos consomem suplementos industrializados, como géis, isotônicos, barras de energia e proteína, e outros que gostam de itens do nosso dia a dia, itens mais naturais, como rapadura, paçoca, salame, azeitona, amendoim etc. Mas isso é o que você prefere e se adapta mais.
Um detalhe diferente do trail pra corrida de rua é que você precisa levar tudo que vai consumir durante a atividade, hidratação e alimentação, pois normalmente não terá ao longo do percurso locais para comprar o que precisar. Diferente de correr na rua que você pode parar para comprar algo em algum lugar pelo caminho.
A sua segurança durante a atividade também é um ponto muito importante, pois o acesso à você pode ser muito complicado, caso algo acontece, dependendo do local onde estiver. Podendo demorar horas um resgate, ou até mesmo apenas pra saber sua localização.
É bom priorizar treinos coletivos ou com pelo menos mais uma pessoa. Ou caso vá sozinho, utilize de algum recurso de localização remota para sua segurança, são várias possibilidades simples hoje em dia.
Os Kits Primeiros Socorros podem parecer uma perda de tempo para a maioria, até de atletas já praticantes. Muitos vão dizer que é uma besteira levar, isso acontece até você precisar e não tiver levado, aí sim passa a ser item essencial. Nas trilhas tudo pode acontecer, coisas simples como cortes, torções, picadas de insetos ou um simples mal estar são as situações mais comuns, até mesmo mais sérias como fraturas. E nesses casos o kit pode realmente salvar sua vida. Serve literalmente para "primeiros socorros", até você ser atendido melhor posteriormente, ou garantir sua segurança até um resgate. Sua vida sempre em primeiro lugar.
Já com relação às distâncias e provas, a recomendação é, "não se afobe!". Curta o processo e se conheça muito bem em cada distância. Não pule etapas. Faça somente o que se sentir confortável. Se você já entra numa prova por exemplo, já preocupado com o tempo de corte, é porque provavelmente não está bem preparado pra esse desafio.
Mas como sempre digo, tudo isso é muito específico de cada um, e não tem como falar "o que é o melhor". Não existe o certo ou errado. O que funciona pra mim, pode não funcionar pra você, e vice-versa.
E isso você também só vai descobrir da melhor forma, correndo, treinando e testando. Experimente tudo nos treinos, nunca em provas.
Mas me conta aí quanto tempo você já pratica o trail run ou se está começando agora.
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E bora pra trilha.
Bora pra cima.
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